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“O profissional da psicologia é visto como o mais forte, mas nós também cansamos”, diz psicóloga

A segunda parte da reportagem que mostra a rotina das psicólogas que estão na linha de frente no combate à covid-19 traz a história da Eveline Menezes Lima, de 36 anos, que trabalha no Hospital Renascença, em Aracaju, Sergipe.

Segundo Eveline, trabalhar na psicologia hospitalar em específico é vivenciar aprendizados diariamente. “E com esse momento em que nós estamos vivendo com tudo acontecendo, os aprendizados são ainda maiores”, disse.

Para ela, por causa da pandemia, o corpo clínico está mais humano, mais empático e as pessoas começam a valorizar mais o trabalho da psicologia. “Vejo que os profissionais da psicologia precisam se fazer mais presentes nesse momento. Não vejo, pelo menos na minha cidade, tantos profissionais na área hospitalar como linha de frente. E eu me sinto um pouco só”, desabafou.

Sobre as experiências, Eveline disse que são muitas e que é possível até escrever um livro contando sobre cada uma delas. “São pessoas que você acompanha, que chegam praticamente mortas e que com o passar do tempo, dos dias, de muitos dias, aquela pessoa vai se recuperando. Porque a covid é um doença que pra sua recuperação é bastante lenta”, explicou.

Por causa disso, é preciso que se tenha paciência, principalmente os familiares. “Eu falo isso pra todos os familiares. A gente precisa trabalhar a nossa ansiedade. Eu sei que angustiante, a gente não têm notícias o tempo inteiro. Eu sei que os dias passam e a paciência precisa ser uma virtude porque o medo é grande. Então é o que eu mais busco trabalhar nos pacientes e familiares”.

A psicóloga disse que a rotina consiste em lidar com muitos pacientes que estavam em estado grave recebendo alta, mas também com muitas mortes. “Sabe quando você se assusta e no elevador tem um corpo… aí você sobe e no outro andar tem outro corpo. E no nosso dia a dia, no hospital, não vemos isso constantemente. E mesmo que você uma experiência vasta, você não tem a frieza de não se impactar com isso, né?”.

Segundo Eveline, chega a ser assustadora a rotina e isso traz uma sobrecarga grande. “O profissional da psicologia é visto como o profissional mais forte da instituição, aquele que recebe a sobrecarga de tudo, é aquele que recebe que passa, segurança, fortaleza, totalmente centrado, tranquilo, harmônico, né? E você está recebendo uma sobrecarga dos familiares, pacientes e funcionários. Mas nós também cansamos”.

“Então, esse profissional da área da saúde, o psicólogo, ele precisa ter um acompanhamento psicoterápico, precisa praticar atividade física, de qualquer jeito, em casa, faz uma uma caminhada no condomínio, na esquina, no quarteirão da casa. Ele precisa fazer meditação e é isso que eu estou buscando a fazer”, comentou.

Mentalmente, Eveline disse que se sente cansada. “Lido com situações emocionantes e vivências que trazem aprendizado. O que realmente é válido na vida da gente? E o nosso papel? Porque a nossa profissão é muito desvalorizada”.

Entretanto, conforme ela, nesse momento em que estamos vivendo, as pessoas estão sentindo a necessidade de um acompanhamento psicoterápico. 

“E isso, infelizmente, aconteceu em um momento ruim, mas felizmente isso me deixa muito bem, muito feliz, porque as pessoas estão reconhecendo a nossa importância. O nosso papel”, afirmou.

A psicóloga disse que durante a pandemia não perdeu apenas pacientes para a covid, mas também pacientes oncológicos e até pacientes que receberam alta.

Ela disse que não tem como escolher qual paciente mais a marcou, mas que alguns vínculos foram criados com ela. “A gente teve uma paciente que ficou com a gente um mês, uma pernambucana de uma felicidade absurda, ela foi entubada, ficou na UTI, foi pro quarto e recebeu alta. Ela até me ligou dias depois dizendo que estava sentindo falta das nossas conversas no hospital”.

O momento mais feliz para Eveline é quando o paciente tem alta. “Os pacientes saem com a sensação que eles venceram a si mesmo, as inseguranças, angústias. Eu me emociono, os profissionais da saúde ficam bem alegres com as altas”. E a maior lição é: “de que esses pacientes conseguem passar por problemas e que eles são fortes”.

Por fim, Eveline disse que a tecnologia tem ajudado nesse momento difícil e que fica emocionada com as ligações de vídeos dos familiares para os entes queridos. “Renova a energia. O paciente fica mais forte. São experiências surreais”, finalizou.

Raíssa França

Raíssa França

Cofundadora do Eufêmea, Jornalista formada pela UNIT Alagoas e pós-graduanda em Direitos Humanos, Gênero e Sexualidade. Em 2023, venceu o Troféu Mulher Imprensa na categoria Nordeste e o prêmio Sebrae Mulher de Negócios em Alagoas.