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Para cada mulher branca morta, 18 negras são assassinadas em AL: “Ausência de políticas públicas”

Em 2018, 55 mulheres negras foram mortas em Alagoas. Entre as brancas, foram três mortas. Os dados do Atlas da Violência, divulgado no final de agosto deste ano, mostra que o estado tem a maior diferença entre violência de mulheres negras e não negras. Para cada mulher branca morta, 18,3 negras são assassinadas.

No Brasil, o cenário também é assustador. Ainda em 2018, uma mulher foi assassinada no Brasil a cada duas horas: foram 4.519 vítimas. Dessas, 68% são mulheres negras. 

O número de mortes de mulheres caiu quase pela metade entre 2017 e 2018: de 104 mulheres negras para 55 vítimas de homicídio. 

O Eufêmea conversou com a cientista social, Amanda Balbino e a estudante de Direito e militante, Mariana Cândido para entender o cenário em Alagoas.

Para Amanda, o Atlas deste ano trouxe dois modos comparativos importantes de análise. “O primeiro longitudinal dos dados de 2008 a 2018, e o segundo dos dados mais recentes de 2017 a 2018, os quais nos possibilita uma avaliação realista do aumento e da diminuição de incidência dos casos de feminicídios nas Unidade Federativas e suas regiões”, disse.

Cientista política, Amanda Balbino

A cientista social disse o número de homicídios femininos no Brasil teve uma relativa queda entre os anos de 2017 e 2018, mas a situação de melhora não se deu para as mulheres negras, que continuam sendo as maiores vítimas de feminicídio. 

“Importante salientar que o paradigma racial não atinge tão somente os jovens negros do sexo masculino, mas também as jovens mulheres negras, em proporções inferiores entre si, mas superiores se somadas juntas em comparação a outras categorias raias como branco, amarelo e índio”, reforçou Amanda.

O fato, para ela, é que em 2018, 68% das mulheres assassinadas no país eram negras. “Essa diferença fica ainda mais explícita quando nos deparamos com os dados que apontam para a concentração de dos índices de letalidade na população negra”.

Segundo Amanda, a desigualdade social, a marginalização do povo preto – seja socialmente, culturalmente ou na construção de estereótipos – reafirmam aspectos de colonização. “Ou seja,  pela ausência de políticas públicas, de acesso a garantias básicas como saúde, educação e segurança”.

A cientista acredita que pensar em política antirracista também é pensar em diminuição dos números de letalidade feminina e masculina pela condição de cor. “Caso contrário continuaremos a ter o estado que mais mata mulheres negras no Brasil”. “Um estado para mulher negra não viver”.
Faltam políticas públicas

Não é de hoje que a estudante de Direito, Mariana Cândido luta pelas mulheres do Estado. Na avaliação da militante, todos os relatórios sobre violência vão colocar sempre o destaque negativo para as pessoas negras.

Mariana é estudante e militante

“Não está no plano de vida de uma pessoa negra praticar crimes. É como se tivesse tudo no plano da vontade daquela pessoa que comete atos que são considerados crimes. Fora do plano da criminalidade, as pessoas negras são mais vítimas”, explicou.

Segundo Mariana, as mulheres negras estão no topo dos feminicídios, das violências, e são as que morrem mais. “Essas mulheres também estão no topo do desemprego”.

A estudante explicou que a cara do desemprego é mulher, negra e nordestina. “Nessas análises setoriais nós precisamos ver quem ocupa os destaques de marginalização e subalternidade na sociedade”. 

Mariana disse que é triste perceber que os governantes não percebam os dados para planejar e desenvolver políticas públicas de inserção para diminuir a realidade.

Por outro lado, a estudante disse que não existe solução rápida e fácil quando se trata dos problemas raciais do país. “Eu já olho torto quando encontro alguém com uma solução assim”.

E questiona: “Como alguém que não tem o que comer, ou onde morar, e quando tem, tem seu filho alvejado por tiros no quintal de casa?”. Mariana diz que são essas situações que precisam ser refletidas.

Para ela, a sociedade precisa refletir sobre o passado que traz uma história marcante para os negros. “Nós temos um problema gigantesco com identidade, não sabemos nem para onde vamos e nem de onde viemos. Nós precisamos discutir a nossa formação histórica. O que nos mantém de pé? Infelizmente, são estruturas que nos desumanizam”. E a formação sócio-histórica mostra como as relações funcionam hoje.

De acordo com a estudante, enquanto não tiver uma organização coletiva e política para mudar esse cenário, a negritude vai viver assim para sempre.

“As estruturas que nos formaram junto com uma sociedade violenta – desde as estruturas até a construção do subjetivo – coloca sempre a mulher negra em situação de subalternização”, justificou.

Raíssa França

Raíssa França

Cofundadora do Eufêmea, Jornalista formada pela UNIT Alagoas e pós-graduanda em Direitos Humanos, Gênero e Sexualidade. Em 2023, venceu o Troféu Mulher Imprensa na categoria Nordeste e o prêmio Sebrae Mulher de Negócios em Alagoas.