Fotos: Maciel Rufino
É a partir das 20h que a Lei da Parada Segura começa a valer. Passageiras que utilizam os coletivos do Sistema Integrado de Mobilidade de Maceió (SIMM) podem descer dos ônibus fora do ponto e no local que elas se sintam mais seguras. Entretanto, apesar da lei ter entrado em vigor em 2017, motoristas e passageiras cobram a mesma medida: a de mais divulgação sobre a lei.
A lei é de autoria da atual deputada federal Tereza Nelma (PSDB), que na época era vereadora de Maceió. Quando a legislação foi aprovada, campanhas foram feitas pela Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito (SMTT) e pela própria então equipe da vereadora.
Cartazes foram colocados nos pontos de ônibus e nos terminais; panfletagens foram feitas e a lei foi divulgada na mídia local. Mas para os motoristas e passageiras, essas ações não foram o suficiente e deveriam ter sido intensificadas.
Três anos depois de entrar em vigor, algumas mulheres desconhecem a lei e os motoristas afirmam que as que conhecem não sabem como ela funciona na prática.
Lei? Como assim?
A estudante de jornalismo Sarah Santos Carnaúba Fonseca, de 19 anos, conheceu a lei por causa de um adesivo que estava no coletivo. Ela trabalhava – aos 17 anos – fazendo bico como professora à noite. “Minha casa ficava bem próximo ao ponto, mas meu bairro é bastante perigoso, principalmente para as mulheres”, disse.
Sarah mora no bairro do Vergel do Lago e afirma que alguns motoristas são compreensivos, mas outros reviravam os olhos quando ela pedia para descer num local mais próximo à casa dela. Um fato que marcou a estudante ocorreu quando ela pediu a uma motorista mulher que parasse mais próximo à casa dela, mas ela se negou.
“Ela me disse que não era minha empregada e que o prefeito não pensa na dignidade dos trabalhadores, em ter que atender a necessidade de cada mulher que tinha no ônibus”, contou.
Sarah ficou indignada com o que aconteceu, mas disse que não deixou de usar a lei que é direito dela. Só que ela enfatiza que a falta de divulgação faz com que várias mulheres não conheçam os seus direitos e que, as poucas campanhas que foram feitas, não surtiram o efeito esperado.
“Nas outras vezes que precisei pegar a linha desta motorista, tinha percebido que o adesivo sobre essa lei tinha sido arrancado, e então parei pra prestar atenção e em muitos ônibus em circulação este adesivo também foi descolado. Tirar um direito de uma minoria é absurdo, mas eu acredito que isso aconteça por não entenderem realmente o porquê dessa lei ser necessária”, explicou.
Ela acredita que a lei deveria ser divulgada em mais canais e que tenham um acesso maio, como comercial nas TVs e nas rádios, outdoors e internet. “Principalmente rádio e outdoor, porque muitos passageiros costumam ouvir rádio durante a viagem e, outdoor é uma mídia pública. Quase impossível você estar em um ônibus e não prestar atenção em pelo menos um outdoor”.
Ela reforça que muitas passageiras desconhecem o direito assegurado, mas que busca incentivar que mais mulheres se informem sobre a Parada Segura.
“E eu percebi que foi a partir da minha postura de exercer esse direito que outras mulheres passaram a exercer também. Já aconteceu de uma mulher, que estava do meu lado, achar um absurdo o motorista parar um pouco mais próximo da casa de uma passageira, e então eu expliquei que era uma lei e que ela também poderia usar. Ela entendeu, agradeceu e passou a usar também”, comentou.
Motorista diz que lei é boa, mas falta divulgação
E não é só Sarah que pensa dessa forma. Os motoristas também. A motorista da empresa Cidade de Maceió, Zilma Batista, de 38 anos, conta que não trabalha no horário da noite, mas que ouve relatos de colegas de profissão que sempre dizem o mesmo: falta divulgação frequente sobre a lei.
“Ela não foi bem divulgada. É uma lei que precisa estar em todos os momentos: nas rádios, Tvs. É um direito que a mulher aderiu e é uma conquista das mulheres. Se você chegar hoje para uma mulher e perguntar sobre a Parada Segura, ela não vai saber te responder. É preciso que se tenha a informação para ambos: passageiros e condutores, todos sabendo seus direitos e deveres”, justificou. Ela ainda acrescenta que a lei é benéfica.
A motorista trabalha no horário da manhã, mas garante que se trabalhasse à noite obedeceria o que manda a lei. “Eu me ponho no lugar da mulher”. Mas também reforça que é preciso olhar o lugar do motorista, já que ele não pode parar em qualquer lugar.
“Não podemos parar em qualquer lugar devido à parada segura direção defensiva. Temos que saber onde parar para não causar um acidente de trânsito”, explicou.
E reforça que muitas passageiras – por desconhecerem o que diz a lei – pedem para que os motoristas parem em locais que não são os corretos.
“Nunca passei por isso, mas alguns colegas falam que algumas passageiras avisam em cima da hora que vão descer ou em locais não apropriados. Acredito que isso causa a dificuldade de ser atendida”, reforçou.
Ela disse que não se para um ônibus de qualquer jeito e que é preciso ter um tempo para que o coletivo pare de maneira segura. “Acredito que a passageira avisando antes fica tudo certo e não fica aquele constrangimento. Conta muito também a forma de pedir e o diálogo”.
(No vídeo abaixo, Zilma fala mais sobre o que acha da Parada Segura)
Passageira sugere campanha de apoio
No começo da lei, a estudante de jornalismo Lisa Gabriela contou que tinha muita dificuldade com os motoristas. Como mora no bairro da Mangabeiras, parte baixa de Maceió e utilizava o coletivo todos os dias na volta da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), foi pela insistência que Lisa conseguiu fazer com que os motoristas entendessem a importância da lei.
“Acho que nas três primeiras vezes que eu tentei usar, duas eu não tive retorno porque o motorista fingiu que não me escutou. Mas aí não me abalei e continuei pedindo para descer perto da minha casa. Depois de um tempo parei de ter problema e acredito que os motoristas foram entendendo mais sobre ela”.
Mas acredita que mesmo utilizando a lei e mostrando para as outras mulheres que a Parada Segura existe, ainda falta muito a se fazer. “Eu vejo muitas mulheres que não conhecem a lei ainda ou sentem vergonha de pedir ao motorista. Percebo que deu uma melhorada, mas não foi o suficiente. Talvez fosse interessante uma campanha de apoio para que mulheres se sintam confortáveis para pedir esse direito”, sugeriu.
Como denunciar?
O Eufemea entrou em contato com a Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito (SMTT) que informou que desde que a lei passou a vigorar em Maceió, 38 denúncias referentes ao seu descumprimento foram realizadas pela população. O órgão orienta que em caso de descumprimento da Lei da Parada Segura, as maceioenses devem formalizar a denúncia através do Disque SMTT, no número 118. O canal de atendimento à população funciona de segunda a sexta-feira, das 7h às 19h.
Propósito da lei não foi absorvido, diz autora
A deputada federal Tereza Nelma, autora da lei quando era vereadora, disse que “desde que a lei entrou em vigor não houve interesse da Prefeitura e das empresas de ônibus em dar visibilidade necessária, mesmo sem despesa ou prejuízo, já que não há qualquer desvio à rota percorrida pelo veículo”.
Tereza acredita que o real propósito da lei não foi absorvido. “O propósito é prezar pela integridade física e mental das mulheres que precisam utilizar o transporte público durante a noite, retornando do trabalho, da faculdade ou de outros compromissos”.
Apesar dos desafios, a deputada disse que acredita que os motoristas permanecem cumprindo a lei, até mesmo por sensibilidade aos riscos corridos pelas mulheres à noite, como assaltos e estupros.
“Mas outros, pelo poder da impunidade, não cumprem”. E reforça que é necessária uma campanha mais ampla e contínua, tanto com as passageiras como com os motoristas.
“E mais: que a fiscalização por parte da SMTT seja mais efetiva e rigorosa. A Parada Segura não é uma questão de comodidade, e sim de segurança. As mulheres ficam ainda mais vulneráveis nas ruas durante a noite, e o objetivo da lei é minimizar esses riscos”, enfatiza.
O que diz o Sinturb?
O presidente do Sindicato das Empresas de Transporte Urbano de Maceió (Sinturb), Guilherme Borges, avalia a lei como positiva, mas acredita que ela deve ser mais trabalhada entre as passageiras e rodoviários. “Para que mais passageiras utilizem e mais rodoviários respeitem”, diz.
Guilherme reforçou que “muitas passageiras não entendem como a lei funciona e que o desembarque deve ser feito em qualquer ponto depois das 20h, porém, o motorista não deve desviar do itinerário”.
“O mesmo também acontece sobre o embarque, não é possível parar o veículo para o embarque, por questões de segurança. Mas é uma lei que precisa ser sempre divulgada, pelas empresas e também pelo órgão gestor”.
SMTT garante divulgação
Sobre as divulgações, a SMTT disse que intensificou a divulgação da Lei da Parada Segura com a colagem de cartazes da campanha dentro dos coletivos do Sistema Integrado de Mobilidade de Maceió (SIMM) e nos principais terminais de ônibus da capital. Além disso, fiscais do órgão também distribuíram materiais dentro dos coletivos informando sobre o serviço e o canais de denúncia disponíveis para a população.
A SMTT também assegura que a campanha foi ampliada e reforçada pelo órgão no site oficial e nas redes sociais da Prefeitura de Maceió. Entrevistas para as principais emissoras de TV e de Rádio de Alagoas também foram concedidas, além da divulgação de releases em diversos portais de notícias do estado.
A SMTT destaca, ainda, que todos os cobradores e motoristas das empresas de ônibus que fazem parte do SIMM foram orientados sobre o os horários de funcionamento da Lei da Parada Segura e sobre a importância do cumprimento.