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Cultura do cancelamento: “Cancelar alguém pode ser uma forma do outro provar que é melhor”, diz psicóloga

Você já deve ter ouvido falar sobre a cultura do cancelamento. Nas redes sociais, as pessoas agem como se estivessem em um ‘tribunal’. É uma verdadeira onda que incentiva pessoas a deixarem de apoiar determinadas personalidades ou empresas, públicas ou não, em razão do erro de erro ou conduta reprovável. E o cancelamento vale para qualquer um. Seja ele artista ou não. O BBB21 trouxe esse assunto e tem gerado diversos debates na web.

A professora de psicologia do Centro Universitário Maurício de Nassau Maceió, Sabine Heumann, explicou que o cancelamento funciona como um “linchamento moral, uma punição para alguém que fez algo considerado errado”.

Em 2019, o Dicionário Macquarie, que seleciona anualmente as palavras e expressões que mais moldaram o comportamento humano, elegeu “cultura de cancelamento” como o termo do ano.

Segundo ela, a internet acaba facilitando comportamentos que, muitas vezes, não seriam feitos nas relações face a face.

“É mais difícil sentir empatia por uma pessoa que não está próxima, que não conhecemos, que é apenas um nome na internet”, afirma a psicóloga.

Além disso, existem os grupos que atuam em efeito manada. Por fazer parte de um grupo, as pessoas acabam agindo, muitas vezes, sem questionar ou refletir, apenas replicando. “Isso deixa os ‘canceladores’ mais à vontade, pois outras pessoas pensam da mesma forma, fortalecendo sua visão, e não colocando-a em questão”, completa.

Outro efeito da internet é a impressão de que as pessoas precisam se posicionar e emitir opiniões sobre todos os assuntos. Muitas vezes, sobre temas em que o indivíduo não tem embasamento para discutir. “Não é necessário ter opinião sobre tudo, muito menos opiniões formadas rapidamente, de forma simplificada. Esse reducionismo acaba gerando ainda mais canceladores”, pontua Sabine.

Quando o cancelamento se torna perigoso?

“Pessoas que são excluídas perdem oportunidades e são anuladas, tendo dificuldade de, até mesmo, reparar a ação que pode não ter sido legal”, explica Sabine.

A psicóloga diz que sempre se pergunta qual a razão do cancelamento e o que as pessoas querem ao repreender um erro. “Se quisermos que aquele comportamento seja reparado, precisamos olhar para a pessoa com empatia, entender que todo mundo erra em algum momento e que é possível se transformar”, defende a profissional.

Quais os impactos na vida e saúde mental do cancelado?

“Quando nossas relações nos dizem que não somos bons o bastante, que somos errados, isso pode gerar um impacto grande na autoestima, o que pode ser prejudicial para a saúde mental de maneira global. Também é possível gerar comportamentos que perpetuam esse cancelamento, devido a agressividade, ao descontentamento, a uma postura de defesa/ataque que ser cancelado pode gerar. Ou seja, muitas vezes os canceladores podem já terem sido cancelados ou então têm medo de ser. Quando eu cancelo o outro, coloco o foco nele e a chance de eu ser cancelado é menor, o que acaba gerando um comportamento que pode ser cíclico”, responde Sabine Heumann.

Sabine cita Freud: “quando Pedro me fala sobre Paulo, sei mais de Pedro do que de Paulo”. De acordo com a psicóloga, cancelar alguém, pode ser uma forma de provar ser melhor, mesmo que de forma não consciente. “Quando colocamos uma opinião sobre algo ou alguém, estamos colocando a nossa visão sobre aquilo, ou seja, a nossa subjetividade aparece. Quando algo nos chama atenção em alguém, nos intriga, nos revolta, nos causa tristeza ou outros sentimentos, isso está mostrando alguns aspectos meus”, fala.

“Se quisermos que, de fato, alguém modifique um comportamento, um caminho com mais empatia, diálogo, buscando compreender de onde vem aquela ação, seja um o mais efetivo. Temos a capacidade de mudar, aprender e transformar. Quando eu cancelo alguém, tiro dessa pessoa a possibilidade de transformação”, finaliza Sabine Heumann.

*com informações da Assessoria

Raíssa França

Raíssa França

Cofundadora do Eufêmea, Jornalista formada pela UNIT Alagoas e pós-graduanda em Direitos Humanos, Gênero e Sexualidade. Em 2023, venceu o Troféu Mulher Imprensa na categoria Nordeste e o prêmio Sebrae Mulher de Negócios em Alagoas.