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Inclusão e desafios: Mães denunciam rotina de violências e violações contra filhos com deficiência

Foto: Tássia Silva e filha

O Brasil registrou 4.427 denúncias de violações dos direitos humanos contra crianças de 0 a 12 anos com alguma deficiência no primeiro semestre de 2023. Essas violações englobam violências físicas, sexuais e psicológicas.

Para a faixa etária de 0 a 17 anos, o número de denúncias chega a 5.899, totalizando 12.649 violações. Esses dados foram obtidos a partir do Painel de Dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos e The Lancet Child & Adolescent Health, datados de março de 2022.

Em meio a esse contexto, mães de crianças com deficiência compartilham ao Eufêmea suas jornadas de inclusão e os desafios enfrentados na busca pela garantia dos direitos dessas pessoas.

Tássia Silva relatou detalhes da jornada de sua filha autista, destacando os desafios enfrentados na busca pela inclusão e plena garantia dos direitos das pessoas com deficiência. Luna, de 5 anos, possui autismo nos níveis de suporte 1 e 2, o que envolve dificuldades na fala.

Desde cedo, a criança tem passado por um processo de desenvolvimento e evolução com o auxílio de terapias, iniciadas aos 2 anos e 8 meses, que contribuíram para o aprimoramento de suas habilidades de comunicação.

“Ela [Luna] precisa de uma rotina bem estabelecida para poder agrupar as atividades pertinentes a qualquer ser humano”, diz Tássia.

No entanto, a família enfrenta uma situação de violação dos direitos da pessoa com deficiência quando o plano de saúde descredenciou a clínica onde ela fazia terapia, transferindo-a para outra em fase de estruturação.

“Isso vem causando impacto nas evoluções dela, pois quebrou toda rotina, e agora está passando para novos terapeutas e, enfim, vai demorar mais para a continuidade dos avanços”, denuncia.

Tássia ressalta as consequências geradas por essa situação, assim como a sensação de impunidade devido ao descumprimento da decisão judicial favorável à família. “Com essa situação, além da apreensão que já existe em ter uma criança que precisa de uma dedicação maior, o estresse, ansiedade, sensação de desmoralização e respeito afloram potencialmente”.

A mãe destaca a importância de capacitar profissionais da educação, desde a educação infantil, para que possam identificar precocemente as necessidades das crianças com deficiência e possibilitar intervenções mais efetivas em seu desenvolvimento.

Ela também defende a presença de auxiliares de sala que não apenas acompanhem, mas que também contribuam ativamente para o desenvolvimento das crianças com deficiência. Além disso, enfatiza a importância da conscientização dos pais em educar suas crianças para não tratarem as pessoas com deficiência de forma discriminatória, “pois a luta pela inclusão é diária e infinita”.

Inclusão e respeito

Outra mãe, Rosileide, de 53 anos, enfrenta uma batalha diária pela inclusão e respeito ao seu filho, de 28 anos, que possui retardo mental e transtorno hipercinético. Desde a vida escolar, o filho enfrentou dificuldades, sendo discriminado por uma professora que se recusou a tê-lo em sua turma.

Segundo Rosileide, as dificuldades enfrentadas começaram já nas primeiras fases da vida escolar. Ao chegar na sala de aula, a professora o discriminou, afirmando que “ele não era para a turma dela” e que ela “não era professora de doido”.

“Temos que lutar pela causa. Tem que ter pessoas com qualificação na área da saúde e educação para entender a demanda”, sugere a mãe.

Outra situação de violação ocorreu no transporte público, onde não aceitaram a carteirinha que concede direitos especiais ao seu filho, garantidos por lei. Para lidar com a situação, Rosileide teve que acionar o Ministério Público de Marechal Deodoro, buscando justiça e proteção aos direitos de seu filho.

“Ele não tem autonomia para resolver as coisas sozinho, ele depende de mim para tudo”, ressalta a mãe, enfatizando a importância do apoio e da compreensão da sociedade para garantir que pessoas com deficiência tenham igualdade de oportunidades e acesso aos seus direitos.

Acesso especializado à justiça
Foto: Cortesia

A advogada Thaynara Cavalcanti Pires de Lima, membro da Comissão da Pessoa com Deficiência da OAB/AL, explica que as violações contra menores com deficiência são classificadas como crimes conforme o Código Penal, agravados por envolverem pessoas vulneráveis ou incapazes. Além da legislação penal, as violações também são regidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência.

“Tais violações geralmente são praticadas por familiares e/ou cuidadores que deveriam proteger esse público”.

De acordo com ela, entre as violências mais comuns estão as físicas, psicológicas, sexuais, morais e patrimoniais. Para proteger as vítimas e suas famílias quando ocorre uma violação, Thaynara enfatizou a importância do acolhimento inicial pela equipe multidisciplinar, como o Conselho Tutelar.

“É importante garantir à vítima que ela não será silenciada, nem terá sua palavra posta em dúvida quando confrontada com a dos seus potenciais cuidadores. Ao mesmo tempo, é fundamental assegurar a efetivação da proteção dessa criança ou adolescente”, disse.

Já o processo de denúncia de violações contra PcDs menores de 17 anos pode ser formalizado pela própria vítima, familiares ou de forma compulsória por setores/órgãos públicos que constatarem suspeita ou confirmação de violência.

As denúncias podem ser recebidas em órgãos como os Conselhos Tutelares, Polícia Militar, Centros de Referência da Assistência Social (CRAS), Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS) e Delegacias especializadas. Além disso, o canal de denúncias do Disque 100 também pode ser utilizado para comunicar violações de direitos humanos.

“As crianças ou adolescentes com deficiência que têm seus direitos violados, devem ter garantidas uma escuta especializada de acordo com suas necessidades, por exemplo, se a criança for surda, é essencial a presença de um intérprete para que ela possa expressar-se de forma segura, tendo certeza de que sua denúncia será acolhida em sua integralidade”, destaca.

O que diz a lei?
Foto: Cortesia

A advogada Mariana Colatino enfatiza que os agressores responsabilizados por violações contra PcDs menores de idade podem enfrentar prisão ou pagamento de multas, dependendo da gravidade da violação.

“É importante que a justiça atue com rigor para garantir a proteção dos direitos dessas crianças e adolescentes vulneráveis”, afirma.

Ela avalia que a garantia do acesso à justiça e a adoção de medidas de proteção são essenciais para assegurar que crianças e adolescentes com deficiência tenham seus direitos respeitados e possam viver em um ambiente seguro e inclusivo.

A Lei prevê expressamente o conceito de acessibilidade como a possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida e impõe penas de reclusão e aplicação de multas para casos de crimes e infrações administrativas relacionadas à violação dos direitos das PcDs.

“Apesar da lei, infelizmente a realidade ainda impõe a criação e implementação de políticas públicas para o combate às diversas violações, que são praticadas a todo o momento. Precisamos ensinar a sociedade sobre a inclusão”, lamenta.

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Rebecca Moura

Estudante de Jornalismo pela Universidade Federal de Alagoas e colaboradora no portal Eufêmea, conquistou o primeiro lugar no Prêmio Sinturb de Jornalismo em 2021. Em 2024, obteve duas premiações importantes: primeiro lugar na categoria estudante no 2º Prêmio MPAL de Jornalismo e segundo lugar no III Prêmio de Jornalismo Científico José Marques Melo.