Foto: neuropsicóloga Ana Paula
Exploração emocional, elogios excessivos, atenção intensa e presentes sem motivos especiais. Essas são algumas das características que definem o fenômeno do “love bombing”, ou bombardeio de amor. Embora comece com intenções aparentemente positivas, ele é uma tática de manipulação que pode afetar profundamente suas vítimas.
O amor e a atenção são aspectos fundamentais para construir laços emocionais, porém, como explica a psicóloga especialista em relacionamentos, Keyla Cristine, no love bombing o que se tem é o excesso de atenção, elogios e gestos amorosos iniciais.
“Isso cria uma sensação de euforia e conexão intensa, no entanto, as demonstrações não são sinceras, são uma estratégia para minar os limites emocionais e exercer controle sobre a vítima”, disse ao Eufêmea.
De acordo com a especialista, podemos reconhecer alguns sinais da prática, são eles:
- Rapidez Excessiva: no início de um relacionamento marcado por love bombing, as coisas avançam em ritmo excepcionalmente acelerado. Isso pode incluir declarações de amor profundo em um curto espaço de tempo e planos futuros intensos.
- Atenção Intensa: a vítima se torna o centro da atenção do manipulador, recebendo mensagens constantes e convites para encontros.
- Presentes e Elogios Excessivos: a pessoa praticando o love bombing costuma presentear a vítima com itens caros ou gestos grandiosos. Elogios constantes e exagerados também são uma característica comum.
- Idealização: o manipulador projeta uma imagem idealizada da vítima, enaltecendo suas características e qualidades. Isso pode levar a vítima a sentir-se excepcionalmente especial e única.
Ela ressalta ainda que existem algumas estratégias para lidar ou se proteger do Love Bombing, como:
- Autoconhecimento: entender suas próprias necessidades emocionais pode ajudar a identificar padrões prejudiciais.
- Estabelecer limites: é fundamental definir e manter limites saudáveis no início de um relacionamento, mesmo que a atenção seja positiva.
- Observação Atenta: prestar atenção aos sinais distintivos do love bombing e, se necessário, buscar a opinião de amigos próximos e confiáveis que possam também dar uma perspectiva objetiva sobre suas percepções.
- Conhecer sobre o assunto: quanto mais a pessoa conhecer sobre a temática, mas terá a possibilidade de se prevenir e reconhecer quando pode está se envolvendo em um relacionamento assim.
Alterações de comportamento
Camila*, 21 anos, foi vítima de love bombing. Ela relata que enquanto vivia a situação de manipulação emocional desenvolveu ansiedade, acumulando angústia e incerteza.
De acordo com ela, seu parceiro demonstrava afeto constante, planejava encontros cheios de surpresas e até mesmo presenteava sem motivo aparente. No entanto, as demonstrações intensas de amor se tornaram ciúme excessivo e instabilidade emocional.
Aos poucos, Camila percebeu que algo estava errado. As alterações de comportamento começaram a afetá-la emocionalmente. “Por muitas vezes achei que era muito intensa ou que estava louca e estava cobrando demais, comecei a me sentir instável, ansiosa e insegura”.
Camila diz ainda que se tornou ansiosa por esperar constantemente que ele voltasse a ser como era. “Ele começou a agir de forma estranha, não demonstrava mais interesse, não conversava direito comigo, não fazia planos e diversas vezes foi grosso ou me tratou mal”, continua.
Com o apoio de terapia e amigos próximos, Camila reuniu coragem para enfrentar a situação e terminar o relacionamento.
Ciclo abusivo
A neuropsicóloga especializada em terapias cognitivas e relacionamentos, Ana Paula Torres, avalia que esse padrão manipulativo muitas vezes leva a um ciclo de abuso emocional.
Torres destaca que a pessoa muitas vezes tenta justificar os abusos como eventos passageiros, focando nos momentos de amor excessivo, o que perpetua a esperança de que o parceiro voltará a ser como antes. “Essa esperança faz com que a pessoa fique mais imersa nesse relacionamento e tenha dificuldade de sair disso. O ciclo tende a se repetir e acaba validando cada vez mais esse pensamento de esperança”.
Para a neuropsicóloga, esse comportamento, que não é saudável, pode levar a transtornos psicológicos, incluindo depressão e até ideação suicida. “A melhor estratégia é inicialmente observar de forma crítica os comportamentos da pessoa que você está se envolvendo e caso perceba essa disfunção, a melhor solução é se afastar mesmo. Caso a pessoa já esteja imersa em uma relação abusiva e tenha dificuldade de sair dela, é necessário busca de apoio especializado”, adverte.
*A reportagem usou nome fictício para preservar a identidade da vítima.