(Imagem: Pandagolik1 | Shutterstock)
“Botijão”, “Baleia assassina”, “Magra demais”, “Balofa”. Esses são alguns dos insultos que diversas mulheres ouviram durante a infância. O bullying sofrido permanece em suas memórias até hoje, resultando em sérias consequências em suas vidas.
O Eufêmea entrevistou três mulheres que passaram por episódios de bullying. Essa prática consiste em um conjunto de violências que se repetem por algum período. Geralmente são agressões verbais, físicas e psicológicas.
A dor de Dara
A servidora pública Dara Amâncio, de 27 anos, foi vítima de bullying na escola, enfrentando agressões físicas e verbais. Dara compartilha que, por sempre ter sido uma criança mais gordinha [como ela se referiu à reportagem], recebeu diversos apelidos cruéis e maldosos, como “Baleia assassina”, “Botijão de gás” e “Bola”.
Ela compartilhou que um momento particularmente marcante ocorreu durante uma aula de educação física, quando as outras crianças a chamaram de “bola” e a empurraram até que ela caísse.
Na vida adulta, Dara expressou que se sentia mais livre de medos e inseguranças. Conheceu um homem por quem se apaixonou, e ficaram juntos por alguns meses. “Mas, infelizmente, terminamos. Mais tarde, descobri que o motivo do término foi a vergonha que ele sentiu de ser visto de mãos dadas com uma mulher gorda”, revelou ela.
Dara disse que sempre silenciou as dores, chegando, em alguns momentos, a se automutilar, um comportamento que persiste até hoje. “Quando estou em crise de ansiedade ou sentindo raiva, acabo me mordendo com muita força”, revelou.
As marcas dessas experiências continuam presentes em sua vida adulta. “Desenvolvi distúrbios alimentares, descontando na comida a raiva que senti; também enfrento síndrome do pânico e tenho o hábito de roer unhas, entre outros desafios”, disse Dara.
Hoje, Dara coordenadora um grupo de apoio a mulheres chamado Casulo Plus Size.
“Sempre realizamos reuniões e dinâmicas, e assistimos a filmes juntos sobre questões sociais, seguidos de debates. O grupo foi criado com o objetivo de ajudar mulheres que passaram por traumas semelhantes. Buscamos auxiliar essas mulheres a se verem com mais amor, fortalecer a autoestima e superar traumas.”
‘Aceita doação de roupas’
Jenyfer, vendedora de 29 anos, sempre teve um corpo magro, o que se tornou alvo de zombarias na escola. “Cresci com as pessoas rindo de mim e fazendo comparações. Até mesmo minha própria família fazia isso”, contou.
Um episódio particularmente doloroso foi quando criaram um perfil no Orkut (uma antiga rede social) e publicaram uma foto dela acompanhada da frase: “aceita doação de roupas”. Jenyfer desabafou: “Aquela situação me devastou, especialmente porque estava insegura, a minha situação financeira não era boa naquela época”.
Ela disse que recebeu suporte dos pais na infância e que foi diagnosticada com depressão e síndrome do pânico. Até hoje, ela carrega marcas e não se sente bem com o corpo.
Hoje, mãe de três filhos, ela revela que sente insegurança de mandá-los para a escola e eles viverem algo parecido. “Fico com o coração na mão todos os dias”.
Batalha contra o corpo e espelho
Aos 27 anos, a advogada Nathaly Oliveira relembra que foi chamada de diversos apelidos pejorativos, como “baleia”, “Free Willy” (a baleia orca famosa do filme), “pote de banha”, “gorducha”, “Magali”, ” Mônica” e “balofa”.
“Hoje, ao ver minhas fotos, percebi que não fui uma criança obesa; meu biotipo era mais cheinho, mas isso já era suficiente para que rissem de mim.” Já adulta, Nathaly diz que enfrenta uma batalha contra o corpo e o espelho.
A advogada relembra que passou por diversas situações difíceis, como: ser insultada por um menino de corpo gordo com palavras cruéis; sentir dor ao ter que usar biquíni para ir à piscina; as vezes que chorou quando precisava provar roupas nas lojas; e as lembranças dos colegas de turma que a chamavam de gorda.
“Não sei se a mesma coisa acontecia com outras meninas, mas grande parte das memórias que tenho estão relacionadas ao sexo oposto. Era visivelmente cruel e intencional, e quase sempre vinha deles.”
A advogada iniciou a terapia aos 6 anos e se recorda que conversou sobre esse assunto não só com a terapeuta, mas também com as coordenadoras da escola, que não resolveram nada.
“Lembro-me de conversar sobre isso com uma terapeuta na época, mas nunca foi algo que ela abordou mesmo. Na escola, sempre reclamava para a coordenadora e também para as professoras, mas ficava extremamente frustrada quando, principalmente as coordenadoras, diziam para apenas ignorar os comentários e insultos, alegando que eles parariam se não recebessem atenção. ‘Ah, eles estão fazendo isso porque querem sua atenção. Se você não der atenção, eles vão parar’”.
Ela não sabe até que ponto o bullying contribuiu para desenvolver ou piorar sua ansiedade, mas acredita que seria menos exigente consigo mesma se não tivesse passado por essas situações.