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Fim dos manicômios judiciários? Veja como vai funcionar a medida que coloca os presos em liberdade com tratamento psiquiátrico em AL

FOTO: Luiz Silveira/ Ag. CNJ

Alagoas atualmente conta com 123 pacientes internados no Centro Psiquiátrico Judiciário Pedro Marinho Suruagy, sendo 117 homens e seis mulheres. Eles cumprem penas relacionadas a uma variedade de crimes, que incluem homicídios, estupro, roubo, furto, violência doméstica, entre outros. Essas informações foram fornecidas pela Secretaria de Estado de Ressocialização e Inclusão Social (Seris).

A grande dúvida é: com a Política Antimanicomial do Poder Judiciário, os Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTP) serão extintos?

A lei 10.216 foi uma das bases para a Resolução 487 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de fevereiro de 2023, que instituiu a política antimanicomial e busca cumprir a legislação quanto ao procedimento judicial ou investigatório de pessoas com transtorno mental.

Segundo a Resolução do CNJ, os hospitais de custódia e unidades semelhantes devem ser fechadas parcialmente e proibir novas internações. As atividades devem ser totalmente encerradas em um ano.

A Resolução aponta ainda diretrizes para a atuação da magistratura durante as audiências de custódia, ou seja, ao identificar pessoas com indício de transtorno mental em caráter preventivo e não só a partir da desinstitucionalização de quem já está em Hospital de Custódia.

Ainda de acordo com as informações, essas pessoas continuarão sob os cuidados de um médico e serão acompanhados por uma equipe multidisciplinar treinada, recebendo atendimento de saúde adequado, de acordo com suas respectivas necessidades, sem prejuízo do acompanhamento da medida judicial.

Como vai funcionar?

Foto: Cortesia ao Eufêmea

Ao Eufêmea, Tereza Cristina Tenório, Assistente Social especialista em Gestão e Controle Social de Políticas Públicas e Supervisora da Atenção Psicossocial da Saúde de Alagoas, disse que considera a Resolução um avanço. “Ela vem fazer com que a Lei 10.216 de 2001 seja cumprida, principalmente no campo do judiciário.”

No entanto, a implementação dessa política demanda esforços coordenados por parte de municípios e estados. Tereza Moura Tenório explicou que estão sendo tomadas medidas cruciais, incluindo a criação de Serviços Residenciais Terapêuticos para acolher pessoas que não têm vínculos familiares ou condições de retornar para casa. Além disso, há um foco na qualificação dos serviços de saúde mental, com a transformação de CAPS I ou II em CAPS III, que funcionam 24 horas.

A inclusão de leitos de saúde mental em hospitais gerais também é parte essencial desse processo com o objetivo de proporcionar um tratamento adequado e menos segregado, de acordo com Tereza Cristina.

“É importante também destacar que impõe a necessidade da intersetorialidade das políticas públicas, pois não se trata apenas de um desafio para a saúde, mas também para políticas sociais, como trabalho e geração de renda, inserção nas cidades e assistência social, entre outras”, explicou.

Cada caso está sendo analisado…

No processo de cumprimento da Resolução, foi realizado um censo psicossocial das pessoas internas no Centro Psiquiátrico. Profissionais estão analisando cada caso individualmente para promover desinstitucionalização de forma gradativa e responsável.

“Há um grupo de trabalho que foi instituído pelo Tribunal de Justiça – GITIS – no qual a Secretaria de Saúde faz parte, juntamente com outras secretarias de estado e instâncias do Sistema de Justiça, e estão empenhados na promoção do fechamento do manicômio judiciário e na desinstitucionalização das pessoas em sofrimento mental ali, muitas vezes esquecidas por décadas”, explica.

Tereza também ressaltou a importância da resolução como um catalisador para a ampliação e fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). No entanto, destacou a necessidade de uma mudança na abordagem da saúde mental no país.

“Por muitas vezes e incontáveis situações, os encaminhamentos e direcionamentos eram e são, ainda, na direção de determinações judiciais que favorecem a segregação e o asilamento das pessoas em estruturas manicomiais.”

“Mas na prática a coexistência dos serviços substitutivos com os manicômios não tem sido positiva, pois se manteve a lógica da segregação das pessoas em sofrimento mental”, continua.

Tenório expressou sua esperança e gratidão pelo momento histórico que o Brasil está vivenciando. “apesar de estarmos assoberbados com uma enorme demanda para fazer em um ano o que não foi feito há décadas, estamos felizes e esperançosos”, disse.

Diretrizes

O artigo 13 da referida resolução determina que a medida de internação só deverá ser implementada se ocorrerem hipóteses excepcionais, quando não suficientes outras medidas ou quando compreendida como recurso terapêutico momentaneamente adequado no âmbito dos Projetos Terapêuticos Singulares (PTS).

A internação pode ser aplicada, ainda, quando necessária para o restabelecimento da saúde da pessoa, desde que prescrita pela equipe de saúde, em alinhamento com a Lei 10.2016/2001 que estabelece, em seu Art. 4º, que a internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.

A internação será cumprida em leito de saúde mental em Hospital Geral ou outro equipamento de saúde referenciado pelo Centros de Atenção Psicossocial (Caps), cabendo ao Poder Judiciário atuar para que nenhuma pessoa com transtorno mental seja colocada ou mantida em unidade prisional, ainda que em enfermaria, ou seja submetida à internação em instituições com características asilares.

Rebecca Moura

Rebecca Moura

Estudante de Jornalismo pela Universidade Federal de Alagoas e colaboradora no portal Eufêmea, conquistou o primeiro lugar no Prêmio Sinturb de Jornalismo em 2021. Em 2024, obteve duas premiações importantes: primeiro lugar na categoria estudante no 2º Prêmio MPAL de Jornalismo e segundo lugar no III Prêmio de Jornalismo Científico José Marques Melo.