Colabore com o Eufemea

Mães acadêmicas celebram PL que prorroga conclusão de mestrado ou doutorado em caso de parto ou adoção

A Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei 1741/2022, que estende por, no mínimo, seis meses o prazo para mães entregarem as defesas de mestrado e teses de doutorado, por motivo de parto, nascimento, obtenção de guarda judicial para fins de adoção ou licença adoção.

A proposta, de autoria da deputada federal Talíria Petrone (PSOL-RJ), representa um marco histórico para as mães cientistas, que muitas vezes se veem obrigadas a escolher entre a especialização ou a maternidade. O texto aprovado agora segue para análise do Senado.

‘Adiei a maternidade’

Camila Hermida é professora da Ufal e vice-diretora da faculdade de Economia, Administração e Contabilidade. Como docente, humaniza o debate da realidade das mães cientistas, que lidam com as demandas dos programas de pós-graduação, as atividades domésticas e os cuidados com o filho recém-nascido.

“É inegável que a produtividade da mulher dentro da academia é diminuída depois de um filho, porque a pesquisa científica exige leitura, reflexão e tempo, e a maternidade também, principalmente na primeira infância da criança. Nesse momento, nosso papel como docente é ser flexível e entender essa realidade”, disse ao Eufêmea.

A professora, além de acompanhar a rotina exaustiva das mães na sala de aula, também compartilha do mesmo contexto. Ela revela que adiou a maternidade por um longo período, mesmo tendo uma relação estável com o companheiro, no entanto, engravidou de maneira inesperada durante o pós-doutorado.

“Sempre adiei a maternidade, mesmo sendo casada há 7 anos, porque sabia que ela iria concorrer com os meus objetivos profissionais. Eu soube da gravidez durante o pós-doutorado, o alívio foi que eu já tinha passado no concurso da UFAL, mas mesmo assim, eu fiquei com medo de isso influenciar e eles demorarem a me chamar”, explica ela.

A economista também afirma que o medo de ter filhos antes de atingir os objetivos profissionais partia da falta de representatividade das mulheres em cargos de chefia e em programas de mestrados e doutorados.

“Na minha turma de mestrado eu lembro que só tinham três mulheres na turma, a desigualdade de gênero estava presente até na academia. Se as mulheres já eram minoria, imagine as mães? Naquela época, ser mãe e estar na universidade era uma discussão marginal, principalmente no curso de Economia, que já foi majoritariamente masculino. Não se viam professoras sênior ou à frente de cargos de comando, era uma realidade diferente”.

Segundo Camila, a presença de mulheres em cargos de gestão em mestrados e doutorados traz uma compreensão mais humanizada diante da realidade das discentes, que lidam com a maternidade. “O olhar de uma mulher muda tudo, porque ela já passou por aquela realidade e sabe o quanto é difícil. Eu, por exemplo, só agora depois de o meu filho completar cinco anos que consegui retomar a produção dos artigos e apresentar em grandes eventos, é o que muitas pesquisadoras chamam de penalidade da maternidade”, pontua a docente.

Para ela, a aprovação do projeto é um marco histórico e vai contribuir para que mães não desistam e permaneçam nos mestrados e doutorados. “A lei é muito importante, iremos avançar muito. Com esse gancho, já podemos pensar em outras políticas a serem adotadas, como a ampliação de creches e outras ferramentas que ofereçam rede de apoio às mães”.

“Estou reaprendendo a estabelecer minhas metas diárias”

Arquivo Pessoal

Thassia Nascimento é mãe de dois filhos, arquiteta, e relata que, “como toda mulher”, possui uma agenda cheia para conciliar, mas que vem resistindo para realizar o sonho de obter mais uma especialização.

A arquiteta conta que, ano passado, quando ingressou no programa de doutorado da USP, engravidou logo em seguida do seu segundo filho.

“No meu primeiro ano no programa, entrei em licença maternidade. Ao retornar, percebi que tudo tinha mudado, com um filho de 6 meses precisando de mim, tudo se tornou mais difícil de dar conta. Eu tenho rede de apoio, mas a carga acaba sendo maior para a mãe, para amamentar e sacrificar o sono. Fora que ainda tenho um outro filho de dois anos que também precisa de atenção”, relata ela.

A mãe também revela que tem sentido uma diminuição da sua produtividade, quando comparada à época de mestrado quando tinha menos obrigações.

“Como durmo pouco por causa da amamentação do bebê de madrugada, acabo ficando com menos energia durante o dia e, assim, menos produtiva. Estou reaprendendo a estabelecer minhas metas diárias de trabalho e estudo, não posso exigir de mim igual a época do mestrado”, explica a arquiteta.

Para Thassia, a principal alternativa que as mamães podem contar nesse período, é uma forte rede de apoio. “Por causa da rede de apoio que não desisti de estudar, ela é essencial durante todo o processo, principalmente, quando a criança ainda é muito pequena”.

Em relação ao projeto de lei aprovado, que aumenta o prazo para a entrega das teses de doutorado, a arquiteta considera extremamente importante.

“A lei é inovadora e deve ser implantada, para que as mães não desistam de concluir suas especializações. A licença maternidade que temos não diminui a carga dos primeiros dois anos da criança, que é quando a mãe passa por um longo período de privação de sono. Com o prazo estendido, acredito que ficaremos mais tranquilas e aliviadas”, esclarece a mãe.

Cecília Calado

Cecília Calado

Pernambucana vivendo em terras alagoanas, Cecília Calado é estudante de Jornalismo com experiência em mídias sociais e produção de rádio e TV. Considera o Jornalismo uma ferramenta de transformação social.