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Nova lei: advogadas alertam para possível restrição a direitos de mulheres no parto

Foto: Freepik

Sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e publicada no Diário Oficial da União (DOU) do último dia 28, a lei nº 14.737 garante a todas as mulheres o direito de estarem acompanhadas por pessoa maior de idade em consultas, exames e procedimentos realizados em unidades de saúde públicas.

A nova lei altera duas anteriores: a nº 8.080/1990 e a nº 11.108/2005, conhecidas como Lei Orgânica da Saúde e Lei do Acompanhamento. Embora o novo documento tenha sido positivo na intenção de proteger a mulher nos atendimentos, existe uma latente preocupação quanto a sua aplicação por diversos coletivos de mulheres que afirmam que, na verdade, o diploma vai revogar o direito das parturientes.

Restrição de acompanhante no parto

Isso acontece porque o artigo 19-J que antes permitia expressamente acompanhante durante todo parto foi revogado pela nova lei que agora abre a possibilidade de assistência durante todos os procedimentos realizados em mulheres, por outro lado, afirma que nos casos de atendimentos realizados em centro cirúrgico ou unidade de terapia intensiva, somente será admitida permanência dos profissionais de saúde o que obsta mães de terem garantida esta segurança nas cesarianas.

Mãe de três filhos, a advogada especializada no atendimento de mulheres, Bruna Sales, manifestou a sua indignação à nova lei, demonstrando preocupação em relação à equidade em sua aplicação.

Bruna Sales/ Foto: Arquivo pessoal

“É uma própria ofensa à isonomia. Somente pessoas que possuam familiares ou amigos da saúde poderão ter acompanhante durante o parto, o que revela o seu caráter elitista”.

Ainda preocupada, a advogada aproveitou para lembrar dos inúmeros abusos ocorridos justamente durante os procedimentos cirúrgicos e, alguns, durante o próprio parto. Um dos casos causou repulsa nacional ao ser filmado e divulgado no ano passado (2022), quando um médico anestesista violentou a parturiente na mesa de cirurgia. “Embora o parágrafo quarto não retire direitos expressamente, dá margens para violência, não é uma retirada escancarada, é sutil e ardilosa”, completa.

“Transformar avanço em retrocesso”

Para a pós-doutora e advogada Jessica Hind Ribeiro, proteger a mulher no contexto da saúde é fundamental, diante da vulnerabilidade decorrente da relação médico-paciente. Segundo ela, embora a lei se apresente como um recurso positivo na intenção de proteger a mulher nos atendimentos, existe uma grave lacuna no que se refere a ausência de menção expressa ao parto. “A interpretação da norma deve ser ampliativa e jamais atingir direitos justificando retrocessos caso as equipes médicas deliberadamente passem a utilizar de justificativas falsas para tornar corriqueiro algo que deveria ser excepcional”.

Jessica Hind/ Foto: Arquivo pessoal

Jessica chama atenção para a redação do parágrafo que afirma que tal restrição só seria permitida em caso de ‘justificativa do corpo clínico’, não havendo, para ela, qualquer impeditivo ou justificativa da interrupção do direito.

“Apesar de saber que todo parto está sujeito a riscos, nenhum deles será agravado pela presença do acompanhante, o qual faz parte de um momento importante na vida da gestante e que é protagonizado por ela. É um direito legalmente assegurado, inclusive, com previsão expressa no ECA e em regulamentação expressa no âmbito da saúde”.

Para ela, a lei se trata de um importante mecanismo de proteção e prevenção da integridade das mulheres e, interpretá-la de outro modo é “transformar um necessário avanço em absoluto retrocesso”. “Protegê-las em sua integridade significa protegê-las também no âmbito do parto, o que espero que seja cumprido e efetivado diante do novo cenário que inclui a nova normativa. Assim, devemos aguardar com atenção para clamar por novas mudanças legais ou para a permanência do cenário do acompanhamento no parto diante das outras garantias asseguradas no ordenamento jurídico como um todo”, conclui.

Meline Lopes

Meline Lopes

Jornalista, advogada, especialista em comunicação e em marketing digital. Atuou como repórter de televisão durante 9 anos em diversas emissoras do Brasil. É repórter do Eufêmea.