Foto: Elaine Pimentel
No dia 7 de abril, Taysa Maria dos Santos, de 23 anos, foi vítima de um brutal assassinato a facadas pelo próprio namorado, que, logo em seguida, tirou a própria vida. Em fevereiro, um cenário semelhante abalou Maceió, quando Valkiria de Brito Cavalcanti, de 40 anos, foi assassinada tiros dentro de uma loja por seu ex-marido, que também se suicidou em seguida.
Os dois assassinatos têm algo em comum: feminicídio seguido de suicídio do agressor. O que está por trás desse perfil?
A advogada Anne Caroline Fidelis, especialista em direito das mulheres e pesquisadora mestra em sociologia pela UFAL, avalia que, em geral, os relatos de pessoas que conheciam as vítimas de feminicídio destacam que as próprias mulheres não acreditavam que o agressor fosse capaz de matá-las. Algumas nunca procuraram ajuda e, consequentemente, não receberam qualquer tipo de proteção.
“Em muitos casos sequer houve relato de agressão física, tratando por vezes, de situações antecedidas de violência moral e psicológica”, alerta.
Homem não chora?
Outro ponto de destaque para Anne é o acesso a armas de fogo, já que tem sido o principal instrumento utilizado nesses casos. De acordo com ela, muitos dos feminicidas suicidas são pessoas que trabalham com o uso de armas, inclusive na área da segurança.
“Isso demanda uma atenção do Estado sobre o quanto a facilitação neste acesso colabora com a onda de feminicídios seguidos de suicídio e sobre a questão da saúde mental destes profissionais”, diz.
A ausência de atenção à questão da saúde mental associada ao machismo é uma combinação perigosa. Para a especialista, os homens ainda são socializados de maneira a não terem preparo para lidar com as próprias emoções, já que ainda alimentam a narrativa de que “homem não chora”.
“A violência não surge do nada”
Ela destaca a recorrência de violência prévia nos casos de feminicídio seguido de suicídio, ressaltando a importância de agir desde os primeiros sinais de agressão.
“É crucial compreender que a violência não surge do nada; na maioria dos casos, há um histórico de abusos, sejam eles físicos, psicológicos ou morais”, afirma Fidelis. A advogada enfatiza que não se pode subestimar a capacidade do agressor em produzir violência fatal, principalmente se tiver acesso facilitado a armas de fogo, o que infelizmente é uma recorrência nesses casos.
“Precisamos de políticas públicas que promovam a conscientização e destinem recursos para ampliar a rede de apoio às mulheres, incluindo delegacias especializadas, casas abrigo e centros de referência, além de incentivar a denúncia e capacitar profissionais para lidar com esses casos de forma adequada”, continua.
Sensação de impunidade
Quando o feminicida comete suicídio causa a sensação de impunidade para familiares e amigos. Elaine Pimentel, professora do curso de Direito da UFAL e coordenadora do Grupo de Pesquisa Carmim Feminismo Jurídico, avalia que há um sentimento de que a justiça não pode ser feita, porque o próprio autor do feminicídio dá fim à vida.
Elaine destaca que a morte por suicídio não dá a sensação de justiça feita. Para ela, a sensação é de que nada pode ser feito para responsabilizar alguém. “Então ele também fugiu da responsabilidade ao tirar a própria vida”, continua a professora.
Pimentel aborda ainda a dinâmica das relações de gênero tanto na vitimização das mulheres quanto na condição de um agressor suicida.
“Isso evidencia um grau de sofrimento muito grande que o próprio patriarcado estabelece nessa cultura misógina de eliminação das mulheres. Eles seguem a lógica que a estrutura patriarcal determina nessa cultura possessiva de que as mulheres são objetos do desejo dos homens”, conclui.