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Mulheres relatam dificuldades para manter hobbies em meio à rotina

É comum vermos homens cultivando passatempos que não estejam ligados ao trabalho, como futebol, música, videogame, entre outros. Já entre as mulheres, o cenário é diferente: muitas dedicam seu tempo livre a tarefas domésticas, trabalho, estudos ou cuidados com os filhos. Mas por que essa diferença ainda persiste? Seria uma questão de escolha ou resultado de um modelo social que naturaliza a sobrecarga feminina?

Um dos principais fatores que sustentam essa dinâmica exaustiva já é amplamente reconhecido pelas mulheres: a sobrecarga. De acordo com um estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mesmo quando estão inseridas no mercado de trabalho, as mulheres dedicam, em média, 21,4 horas semanais aos afazeres domésticos e aos cuidados com a família — quase o dobro do tempo dos homens.

O acúmulo de funções impede que muitas mulheres sequer considerem iniciar um hobby. Quando dispõem de um tempo livre, costumam usá-lo para resolver pendências ou simplesmente descansar antes de retomar a rotina exaustiva.

De acordo com a psicóloga Thalia Conceição, esse padrão de comportamento não surge na vida adulta, mas é imposto desde a infância. “Enquanto os meninos são incentivados a buscar diversão e desafios pessoais, as meninas aprendem, desde cedo, a priorizar o outro”, explica. Como consequência, muitas mulheres crescem sem o hábito de cultivar interesses próprios, encarando o lazer como algo secundário.

“Além disso, há um sentimento enraizado de que, ao dedicarem tempo para si mesmas, as mulheres estão sendo egoístas ou negligentes com as demandas da família e do trabalho. Isso faz com que posterguem momentos de lazer ou os vejam como um luxo, e não como uma necessidade”, destaca Thalia.

Hobbies como ferramenta de bem-estar

Foto: Psicóloga Thalia Conceição

Os hobbies desempenham um papel essencial na regulação emocional e no bem-estar psicológico, como explica a psicóloga Thalia Conceição. Ao se envolver em atividades que trazem satisfação, o cérebro libera neurotransmissores como dopamina e serotonina, substâncias responsáveis por promover sensações de prazer e relaxamento.

Mais do que uma simples forma de lazer, ter um hobby possibilita que as mulheres se reconectem consigo mesmas, criando um espaço de descompressão em meio à sobrecarga diária. “Muitas pessoas sentem que são apenas profissionais, mães, esposas ou estudantes, mas esquecem que também são indivíduos com interesses próprios. Ter um hobby permite resgatar essa identidade pessoal”, destaca Thalia.

Pintura como hobby

Foto: Cortesia ao Eufêmea

Para a estudante de Serviço Social Amily Sousa, a pintura representa um reencontro com sua infância. Ela lembra que, desde pequena, adorava desenhar e ficou completamente realizada ao ganhar um pacote de canetinhas coloridas. Hoje, aos 22 anos, manter esse contato com a arte se tornou tanto um resgate afetivo quanto uma válvula de escape para lidar com a rotina intensa.

“Sempre que estou mal emocionalmente, mentalmente ou até fisicamente, busco desenhar ou pintar para me sentir bem comigo mesma. É algo que me traz paz”, compartilha Amily.

Hobbies e a construção de novas conexões

Foto: Cortesia ao Eufêmea

Para muitas mulheres, encontrar um hobby não significa apenas reservar um tempo para si mesmas, mas também se conectar com novas pessoas e fortalecer laços sociais. Foi o que aconteceu com a consultora óptica Mirella Oliveira, que decidiu buscar uma atividade que a incentivasse a sair de casa, movimentar o corpo e explorar novos ambientes.

Ao relembrar um desejo da infância, Mirella encontrou na patinação um hobby que trouxe benefícios além do esperado. “Eu conheci muita gente, fiz muitos amigos da patinação”, conta.

Além da prática esportiva, o grupo que formou se tornou uma fonte de motivação e apoio. “Muitas vezes eu chegava lá e não queria patinar, por causa do cansaço. Mas eles insistiam, me chamavam, e quando eu finalmente decidia ir, pensava: ‘Meu Deus, eu amo patinar, me sinto livre assim’”, compartilha.

Dificuldades para conciliar o lazer com a rotina

Embora encontre na patinação uma fonte de prazer e bem-estar, Mirella Oliveira admite que nem sempre consegue praticar seu hobby com a frequência desejada. Entre as obrigações do trabalho, faculdade e atividades domésticas, muitas vezes a patinação fica em segundo plano devido ao cansaço acumulado.

“Quando vou patinar, sei que no dia seguinte vou acordar cansada para ir trabalhar. Meu maior desafio hoje é esse: eu trabalho o dia todo e, quando chega a noite, só quero descansar”, relata.

Ainda assim, ela tenta priorizar a atividade, pois percebe os impactos positivos na qualidade de vida e saúde mental. “Nas semanas em que não consigo patinar, minha rotina fica mais pesada. Por isso, tento praticar pelo menos dois a três dias por semana”, afirma.

O impacto da ausência de lazer na saúde mental

Criar um espaço na rotina para atividades prazerosas e criativas é essencial para a manutenção da saúde psicológica. Segundo a psicóloga Thalia Conceição, um estilo de vida sobrecarregado e sem momentos de lazer pode levar a estados crônicos de estresse, ansiedade e até depressão.

“Sem atividades prazerosas, há um risco maior de recorrermos a estratégias desadaptativas de enfrentamento, como o uso excessivo de redes sociais para distração passiva, compulsões alimentares, procrastinação e outras formas de compensação que, a longo prazo, podem agravar a sensação de vazio e insatisfação”, alerta.

Nos casos mais extremos, a falta de momentos de prazer pode levar ao burnout, com sintomas como fadiga extrema, apatia e desmotivação. Incorporar hobbies na rotina, seja tocar um instrumento, praticar um esporte ou aprender algo novo, ajuda a enxergar além das responsabilidades diárias, restabelecendo o equilíbrio emocional.

Como incluir um hobby na rotina?

Para começar, não é necessário um grande compromisso de tempo ou dinheiro. A psicóloga destaca que apenas 10 a 15 minutos diários já são suficientes para explorar uma atividade prazerosa. O mais importante é tratar esse tempo como um compromisso inadiável, com a mesma seriedade que um compromisso profissional ou familiar.

“Não se preocupe com ‘ser boa’ naquilo, pois o objetivo do hobby não é ser produtivo ou perfeito, mas sim trazer prazer. Se você gosta de cantar, cante sem se preocupar com afinação. Se quer desenhar, desenhe sem medo de errar. O importante é a experiência, não o resultado final”, conclui Thalia.