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Rivalidade entre adolescentes: o que o caso de Antonela revela sobre pressão e exclusão

Foto: Reprodução/Instagram Antonela

Nos últimos dias, as redes sociais foram inundadas por comentários, vídeos e especulações em torno de um conflito entre influenciadoras adolescentes. A briga, que envolveu Antonela Braga, Liz Macedo, Júlia Pimentel e Duda Guerra, viralizou como mais uma fofoca do universo teen. No entanto, por trás do enredo aparentemente superficial, emergiu uma questão relevante: os impactos da rivalidade entre meninas, especialmente na adolescência.

Entenda o que aconteceu

O centro da discussão é Antonela, de 16 anos, que relatou ter sido excluída e hostilizada por outras influenciadoras durante uma viagem de trabalho a Gramado (RS). Segundo ela, o conflito começou após solicitar seguir o perfil privado de Benício Huck — filho dos apresentadores Luciano Huck e Angélica — atual namorado de Duda Guerra.

A partir desse gesto, Antonela afirma ter sido confrontada por Duda e ignorada pelas demais meninas do grupo. O relato foi feito em vídeos publicados no TikTok. O primeiro deles, em que comenta o ocorrido, já ultrapassa 20 milhões de visualizações e soma mais de 2 milhões de curtidas, reforçando a repercussão do caso.

Além do episódio com Duda, Antonela também relatou conflitos anteriores com outras meninas do mesmo grupo – quase sempre em contextos envolvendo figuras masculinas. Os relatos mostram como a presença masculina ainda opera como elemento central de tensão entre adolescentes, especialmente em ambientes onde a validação social está fortemente ligada ao status afetivo. É o que explica a psicóloga clínica e mestranda em Psicologia Carliane Batista.

“A rivalidade entre meninas é, antes de tudo, um reflexo de construções sociais e históricas enraizadas em uma lógica patriarcal. Durante séculos, as mulheres foram colocadas em posições de disputa por espaços, atenção e validação, especialmente em torno de figuras masculinas”, afirma a psicóloga ao Eufêmea.

Validação social e os impactos da exclusão

Foto: Arquivo Pessoal

Na adolescência — fase em que identidade e autoestima estão em construção — o olhar do outro ganha um peso significativo. Segundo a psicóloga Carliane Batista, a necessidade de validação externa se intensifica nesse período, o que tende a amplificar os efeitos de rejeições e conflitos.

“Quando uma adolescente se sente excluída ou atacada por outras meninas, isso pode gerar impactos emocionais profundos, como sentimentos de inadequação, angústia e baixa autoestima. A rejeição pode reativar inseguranças antigas, ligadas a vivências infantis como a rivalidade fraterna ou o medo de abandono”, explica.

A exposição constante de influenciadoras adolescentes em ambientes competitivos, como viagens de trabalho, eventos e redes sociais também demanda atenção. Carliane alerta para sintomas frequentes em contextos de exclusão, como isolamento, alterações de humor, ansiedade e queda na autoestima.

Para além da vivência individual, a psicóloga aponta que esses comportamentos também têm um caráter coletivo. “Se pensarmos pela ótica da psicologia de massa, esses padrões são aprendidos e repetidos coletivamente. Seguimos reproduzindo comportamentos porque eles são validados o tempo todo pela mídia, pelas redes sociais, pelas estruturas escolares e familiares.”

Na avaliação da especialista, fortalecer a autoestima das meninas vai além de mensagens motivacionais. “É preciso criar um espaço interno e social em que a diferença da outra não seja percebida como ameaça, mas como possibilidade de convivência e aprendizado. Quanto mais sólida for essa base emocional, menor será o espaço para rivalidade e maior, a chance de relações saudáveis e respeitosas.”

A rivalidade começa cedo

Foto: Arquivo Pessoal

A psicóloga Isabelle Berta, pós-graduanda em Neuropsicologia, reforça que a rivalidade entre meninas não é um traço natural, mas uma construção cultural que se manifesta desde a infância. Segundo ela, há uma diferença clara na forma como meninos e meninas são ensinados a se relacionar.

“Enquanto os meninos costumam ser incentivados à união, as meninas frequentemente são colocadas em posição de disputa. Isso aparece em filmes, nas relações sociais e até em ambientes profissionais. Estamos cercadas por rivalidade feminina, e crianças e adolescentes aprendem com o que veem”, observa.

Pressão estética e rejeição social

Isabelle destaca que, desde cedo, a construção da autoestima enfrenta desafios emocionais e sociais que se intensificam na adolescência, especialmente quando essa autoestima depende da necessidade de agradar, corresponder a expectativas ou se comparar constantemente.

“Imagina uma menina crescendo sob a pressão dos padrões de beleza reforçados diariamente nas redes, enfrentando comentários tóxicos e vivendo sua vida social sob constante exposição. Isso abala a forma como ela se enxerga e também como enxerga o outro.”

A psicóloga também aponta que a exclusão social tem impactos que vão além do emocional. Estudos como o Cyberball Experiment mostram que a rejeição ativa áreas do cérebro associadas à dor física, como o córtex cingulado anterior dorsal. “Ou seja, nosso cérebro pode reagir à rejeição social como se estivesse sentindo dor física de verdade. E quanto maior a sensação de rejeição, maior a atividade cerebral ligada ao sofrimento.”

Nas redes sociais, essa experiência se intensifica. Para adolescentes hiperconectadas, a exclusão não é apenas percebida: ela se torna pública, visível, compartilhada em tempo real, o que agrava sentimentos de solidão e contribui para quadros de ansiedade, depressão e dificuldade de estabelecer vínculos saudáveis.

Proteção ou exposição?

O envolvimento das famílias também repercutiu nas redes. Mães e responsáveis publicaram vídeos defendendo as filhas, mas, em alguns casos, os conteúdos acabaram acirrando a polarização e ampliando a exposição das adolescentes, inclusive alimentando discursos de ódio e cancelamento.

Mesmo com a presença digital ativa dessas jovens, a psicóloga Isabelle Berta reforça que a responsabilidade das famílias continua sendo fundamental. Para ela, é essencial que haja limites e uma relação de confiança entre responsáveis e adolescentes.

“O ideal é que os adultos ajudem a adolescente a nomear o que sente, refletir sobre o que está vivendo e desenvolver recursos emocionais. Mais do que resolver o problema por ela, é importante apoiar sua autonomia.”

Em situações como a de Antonela e Liz, nas quais os responsáveis entram diretamente no conflito, Isabelle alerta para os riscos.

“Quando os adultos assumem o embate para ‘defender’ as filhas, acabam amplificando a discussão e dificultando a resolução. A opinião pública se forma a partir dos vídeos publicados, o que amplia a exclusão e pode levar ao cancelamento ou à propagação de discursos de ódio nas redes sociais”, conclui.

Foto de Rebecca Moura

Rebecca Moura

Estudante de Jornalismo pela Universidade Federal de Alagoas e colaboradora no portal Eufêmea, conquistou o primeiro lugar no Prêmio Sinturb de Jornalismo em 2021. Em 2024, obteve duas premiações importantes: primeiro lugar na categoria estudante no 2º Prêmio MPAL de Jornalismo e segundo lugar no III Prêmio de Jornalismo Científico José Marques Melo.