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Solidária, engajada, mãe: julgamento do feminicídio de Marcelle Bulhões começa com forte comoção

(Matéria em atualização)

Foto: Ascom MP/AL

Teve início na manhã desta segunda-feira (26) o julgamento do caso que chocou Alagoas em 2023: o assassinato da farmacêutica Marcelle Bulhões, morta brutalmente a pedradas no bairro Cidade Universitária, em Maceió, no Dia Internacional da Mulher. O júri está sendo realizado no salão da 8ª Vara Criminal de Maceió e coloca no banco dos réus Cícero Messias da Silva Júnior, ex-companheiro da vítima.

A acusação é conduzida pelo promotor de Justiça Tácito Yuri. Familiares, amigos, representantes de movimentos feministas e integrantes da sociedade civil acompanham o julgamento.

Logo no início da sessão, o filho de Marcelle, Matheus Bulhões foi ouvido. Abalado, ele relatou que o réu havia ameaçado esquartejar sua mãe e que, segundo mensagens encontradas no celular dela, tentava extorqui-la com ameaças envolvendo conteúdos que poderiam comprometê-la. O filho da vítima chora de forma incontrolável, segundo informações do Ministério Público de Alagoas.

Durante o julgamento, foi questionado se, após o crime, alguém havia conseguido conter o acusado. Uma testemunha respondeu que apenas dois adolescentes, menores de idade na época, correram atrás dele. Segundo ela, mais ninguém tomou qualquer atitude para impedir a fuga.

Depoimentos de jovens que tentaram deter o réu

Dois adolescentes, menores de idade na época do crime, foram ouvidos. Um deles contou que acordou com a mãe chamando o primo e, ao abrir a porta, viu o acusado puxando Marcelle pela blusa para o outro lado da rua. Quando ela caiu, ele a golpeou com uma pedra pesada na cabeça. O jovem gritou pedindo que o agressor parasse, mas o réu fugiu ao perceber que estava sendo observado.

Eles tentaram encurralar o acusado numa travessa, mas não conseguiram contê-lo. Segundo o depoente, ao retornar ao local do crime, passou rapidamente por onde Marcelle estava caída, sendo amparada por uma mulher. “Saía muito sangue da cabeça dela”, disse.

O outro jovem também relatou ter presenciado o momento do crime. Ele viu quando Marcelle, ainda dentro do carro, era agredida com socos e teve a cabeça batida contra o volante. O réu a retirou do carro e a jogou ao chão, dizendo que iria matá-la e pedindo que o jovem o ajudasse. A testemunha contou que o acusado o ameaçou de morte caso tentasse intervir.

Mesmo inconsciente em pé, segundo o depoente, Marcelle foi atingida por uma pedra na cabeça. Ela caiu e, ainda assim, o agressor golpeou sua cabeça com a pedra mais duas vezes. O jovem relatou ainda que o réu estava armado com uma faca durante toda a agressão.

Uma pessoa generosa e amiga

Testemunhas ouvidas até o momento destacaram o perfil generoso e engajado de Marcelle. Uma moradora da comunidade contou que a vítima era conhecida por ações solidárias: distribuía cestas básicas e medicamentos, ajudava famílias enlutadas com caixões, promovia atividades culturais e esportivas para crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade, e acompanhava moradores a consultas médicas e odontológicas.

“Achei que ela ainda estava viva”

Também foi ouvida uma amiga de Marcelle que foi ao local do assassinato e a colocou nos braços. Segundo ela, Marcelle já vinha sendo espancada em casa e correu para a rua em busca de socorro, mas não foi ajudada. “Ela estava com um ronco, eu achava que ela ainda estava viva, mas o médico do Samu disse que não estava mais”, afirmou.

As testemunhas também relataram que, durante o carnaval, o réu teria invadido a casa de Marcelle e permanecido escondido no local, esperando pela chegada da vítima. Segundo os depoimentos, ao retornar para casa, Marcelle notou uma luz acesa e, em seguida, apagada. Desconfiada, ela correu para pedir ajuda e acionou a polícia, pois percebeu que havia alguém dentro da residência.

Racismo religioso e estratégia da defesa

Durante as oitivas, a defesa do réu insistiu diversas vezes para que as testemunhas falassem sobre a religião de Marcelle, afirmando que ela praticava a Umbanda. Para o Ministério Público e a assistente de acusação, essa linha de questionamento representa uma tentativa deliberada de descredibilizar a vítima com base em racismo religioso, o que foi repudiado pelas partes.

Foto de Raíssa França

Raíssa França

Cofundadora do Eufêmea, Jornalista formada pela UNIT Alagoas e pós-graduanda em Direitos Humanos, Gênero e Sexualidade. Em 2023, venceu o Troféu Mulher Imprensa na categoria Nordeste e o prêmio Sebrae Mulher de Negócios em Alagoas.