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Quando a cor da pele vira suspeita

Para o texto de hoje, convidei a psicóloga Milla Kaliane Rocha (CRP 19/2833) para trazer uma reflexão urgente e necessária: como a cor da pele ainda é transformada em suspeita em nossa sociedade e quais os impactos dessa violência cotidiana na saúde mental da população negra.

Recentemente, um casal de jovens negros foi abordado em um bar e, diante de olhares desconfiados, quatro homens exigiram que abrissem suas bolsas. O motivo? Foram confundidos com assaltantes. Não havia prova, apenas a cor da pele e os estereótipos que a acompanham.

Esse não é um caso isolado. É o reflexo de um país que insiste em associar juventude negra à criminalidade, reproduzindo o racismo estrutural que nos atravessa há séculos. Episódios como esse não só expõem a desigualdade racial, mas também produzem feridas emocionais profundas: humilhação pública, medo constante e a dolorosa sensação de não pertencimento.

Na perspectiva psicológica, situações como essa são gatilhos para estados de ansiedade, estresse e hipervigilância. O corpo e a mente passam a viver em alerta, como se o perigo fosse iminente a todo instante. E, infelizmente, é. Para a população negra, estar em espaços públicos nem sempre é sinônimo de lazer, mas de sobrevivência e resistência.

A cada abordagem injusta, o corpo negro é colocado no lugar da suspeita, e o direito de existir com dignidade é negado. Essas experiências marcam a subjetividade, reforçam a desconfiança em relação às instituições e impactam diretamente a saúde mental. Não é apenas sobre um bar ou uma noite estragada. É sobre vidas inteiras sendo atravessadas por violências cotidianas.

Precisamos falar sobre isso. Precisamos reconhecer que não se trata de “casos isolados”, mas de um sistema que legitima quem é visto como cidadão e quem é constantemente acusado. É urgente que, como sociedade, nos responsabilizemos: questionando nossos olhares, nossos silêncios e, principalmente, a forma como normalizamos essas práticas e tantas outras.

A população negra merece viver o simples direito de ocupar espaços sem medo de ser tratada com tamanha crueldade. Reconhecer isso é um passo essencial na luta contra o racismo e pela construção de uma sociedade verdadeiramente justa. A pele negra não deve carregar o peso da sentença, e sim o valor do pertencimento.

Milla Kaliane Rocha
Psicóloga
CRP 19/2833

Foto de Natasha Taques

Natasha Taques

Psicóloga clínica (CRP-15/6536), formada em Terapia do Esquema pelo Instituto de Educação e Reabilitação Emocional (INSERE), Formação em Terapia do Esquema para casal pelo Instituto de Teoria e Pesquisa em Psicoterapia Cognitivo-Comportamental (ITPC).
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