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“Sou gordofóbica”, diz mulher que evita comer em público e vive isolamento social por causa do corpo

Foto: Depositphotos

“Se eu me recusar, você fica chateada? É que é uma questão tão complicada pra mim… Na verdade, não tenho muito o que relatar de situações de gordofobia que sofri, porque na verdade, eu sou gordofóbica. Eu evito me colocar em situações em que possa sofrer preconceito por conta do meu peso”. O desabafo é de *Maria, nome fictício da personagem do Eufemea que pediu para não ser identificada, mas aceitou que suas informações fossem compartilhadas pela reportagem. 

Maria justifica: “Se você quiser usar o que falo aqui na sua matéria fique à vontade, mas não me identifique por favor, não quero que as pessoas sintam pena”. 

Durante a conversa, ela relatou o que sofre por estar acima do padrão imposto pela sociedade e ser gorda.  

“Tudo na minha vida gira em torno do meu tamanho. Não vou ao dentista porque da última vez que fui a cadeira deu um estalo, não aprendi a dirigir porque me envergonhava ficar ajustando o banco e o volante do carro, e não ando de ônibus porque tenho vergonha de me espremer para passar pela catraca”. 

O isolamento social não para por aí e afeta o simples e necessário ato de se alimentar. “Eu evito comer em público, porque acho que as pessoas vão ficar me olhando. Minha vida social é praticamente nula”. 

As roupas que usa, ela diz que é outro ritual e o casamento, que acabou, atribui ao corpo. “Eu só compro roupas em uma loja porque conheço a dona e ela me deixa levar as peças pra casa pra experimentar. E até a separação do meu ex-marido está relacionada com meu peso”, diz. 

“Eu tinha vergonha até dele, ao mesmo tempo que dizia que ele tinha que gostar de mim do jeito que eu era. Quando ele terminou comigo, não usou as palavras gorda, mas disse que era difícil conviver com quem não tem amor próprio”. 

“Armadura que criei” 

Ela buscou ajuda psicológica e ouviu do profissional que tem depressão. “No pouco de terapia que fiz, o psicólogo disse que eu tenho depressão desde a adolescência e que é difícil dizer se foi o peso que desencadeou a depressão ou a depressão o excesso de peso”. 

Porém, Maria conta que antes de ser gorda, ela era magra demais e também tinha vergonha do  corpo.

“Até a faculdade, pra falar a verdade, eu era magrela, queria ganhar peso porque aquele osso do quadril ficava despontando. Na terapia, me explicaram que meu ganho de peso foi uma armadura que criei pra mim, contra assédio, e também porque achava que as pessoas não me levavam a sério. Estou me organizando pra voltar a fazer terapia, não posso mesmo deixar que isso acabe com a minha vida. Eu nem chego a sentir gordofobia de fora, sabe?”. 

No relato-desabafo, ela fala sobre padrão. “Por mais que a gente saiba que o “padrão” só existe porque é uma das indústrias mais rentáveis do planeta, está misturada ao machismo e enraizada na mente coletiva”.

“Depois de nossa conversa ontem, passei a lembrar de tantas situações… por conta da suspeita de covid, fui em uma unidade sentinela e, na pré-consulta, verificaram minha pressão e glicemia. O enfermeiro ficou admirado por eu não ter pressão alta ou diabetes.  E nas últimas vezes que busquei atendimento médico, sempre os problemas de saúde são relacionados ao meu peso, para os médicos”. 

“É tão difícil ser gorda. Se geral soubesse o quanto é difícil, não achava que gordo é relaxado, preguiçoso, relapso…”.