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Letras, temática, danças e ritmos: a potência feminina por trás dos folguedos alagoanos

Reportagem: Maria Villanova*

Imagine vivenciar a história diante dos olhos, de forma colorida e entusiasmada, através de toadas, cantos, danças e muita representatividade? Os folguedos alagoanos, em suas apresentações, trazem um arsenal de ritmos e mostram a diversidade do estado. Entretanto, poucos são os jovens que, de fato, têm conhecimento sobre este arsenal cultural mantido sobretudo pela força e representatividade dos brincantes, em sua maioria feminina.

É histórica a presença feminina nos folguedos e hoje ela está em todos os lugares, até mesmo naqueles que antigamente eram de exclusividade masculina, como nos conta a professora e museóloga Cármen Lúcia Dantas.  Exemplos não faltam, como a Mestra Joana Gajuru, falecida há mais de 30 anos, que desafiou os parâmetros da época.

“Joana Gajuru era mestra de um folguedo de predominância masculina, sobretudo de mestres. E seus figurantes lhe deviam total obediência, porque era uma mulher muito rigorosa no comando do folguedo”, conta Cármen Lúcia ao Eufêmea.

E inspiradas pelo passado, as mulheres continuam a romper estereótipos, ocupando cada vez mais espaços em folguedos tradicionalmente masculinos.

É o caso da Chegança, que traz a história dos marujos da Marinha Brasileira, e que hoje conta com um grupo feminino: a Chegança Silva Jardim, que durante anos foi administrada pela mestra Luzia Simões e que, com o seu falecimento, hoje é liderado pela mestra Lucimar Alves.

Mestra Lucimar, da Chegança Silva Jardim, de Coqueiro Seco. Crédito da foto: Maria Villanova

“Eu me sinto realizada porque hoje somos a única Chegança viva do estado de Alagoas. É importante a presença feminina no folguedo, por manter a tradição folclórica nos dias de hoje.”, ressalta Lucimar.

Responsáveis pela tradição

São as mulheres as maiores responsáveis pela manutenção da tradição, resgate histórico sinônimo de força para que os folguedos permaneçam vivos. Guardiãs incansáveis, se espelham muitas vezes em suas mães e se desdobram em várias para que possam conciliar a vida pessoal com a vida artística.

Mestra Regina. Crédito da foto: Maria Villanova

“Eu trabalho em casa, com meu mercadinho, mas funciona de manhã. A tarde saio pegando as senhoras, vamos pra sede e ensaiamos. Eu lembro de quando eu era pequena e minha mãe dançava o pagode dos escravos, que ninguém sabe mais. Eu incentivo as Baianas, para não deixar morrer”, ressalta a líder das Baianas de São Miguel dos Milagres, Mestra Regina.

Preconceito e falta de conhecimento

Infelizmente, muitos folguedos femininos ainda enfrentam o preconceito e a falta de conhecimento por parte da população, sendo esses obstáculos a serem superados diariamente, como nos conta a Mestra Ana Paula, das Taieiras de São Miguel dos Campos.

Hoje, o único grupo de Taieiras do Estado, que acredita que por ser um folguedo de origem africana, exaltando santos negros, tem menos valorização por parte da sociedade. Mas isso não é um empecilho para a demonstração de sua arte.

 Mestra Ana Paula, das Taieras de São Miguel dos Campos. Crédito da foto: Maria Villanova

“Eu me dedico mesmo, gosto de perseverar, eu me sinto realizada quando estou com as Taieiras. Agora, estamos montando um grupo de Taierinhas em uma escola de São Miguel dos Campos. A maioria das brincantes é idosa, e eu acho importante passar de geração em geração, uma forma de não deixar morrer nossa cultura, dela continuar a prevalecer”.

O reconhecimento da força feminina vem das mestras do passado, das brincantes de hoje, e da obstinação que essas mulheres têm em manter a cultura viva e perpetuar às gerações as tradições de Alagoas.