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Ela ensina com as mãos: Professora surda transforma inclusão em prática na sala de aula da Uncisal

Foto: Assessoria

“Inclusão não é favor, é direito”. A frase curta, dita com firmeza por Juliana Luciani de Melo Nascimento, sintetiza a potência de sua trajetória: mulher, surda, professora da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal). Neste 24 de abril, Dia Nacional da Língua Brasileira de Sinais (Libras), ela é o símbolo vivo do que significa ocupar espaços com competência, resistência e representatividade.

Formada em Pedagogia pelo Cesmac e em Letras-Libras pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Juliana é professora na Uncisal desde que foi aprovada em primeiro lugar no concurso da instituição — uma conquista que marcou sua carreira e sua vida. Ela ainda é especialista em Tradução, Interpretação de Libras e Língua Portuguesa pela Faculdade Estácio.

Desde pequena, Libras já era parte do seu cotidiano. “Brincava de ser professora com meus primos e vizinhos. Sempre ensinei Libras como se fosse algo natural. Cresci com isso dentro de mim”, relembra. Com formação sólida e experiência como docente substituta na Ufal, ela chegou à Uncisal pronta para ensinar.

“Não foi um grande desafio estar em sala como professora surda. A dificuldade maior era a comunicação, mas, com o tempo e com o apoio de colegas, como a professora Liliane Dizeu, tudo foi se tornando mais acessível”.

Hoje, Juliana comanda suas turmas com a tranquilidade de quem construiu um método próprio, acessível e afetuoso. “Uso vídeos em Libras, slides adaptados e incentivo a participação ativa. Estimulo os alunos a aprenderem sinais, porque acredito que a comunicação precisa ser uma via de mão dupla”, explica. Esse diálogo só é possível graças à atuação da intérprete Dayseelle Magalhães, presença constante ao seu lado em sala de aula e nos planejamentos.

“Minha função é mediar a comunicação — da Libras para o português e vice-versa — de forma neutra e fiel. Trabalho em parceria com Juliana para garantir que seus conteúdos e ideias cheguem aos alunos com clareza e respeito”, conta Dayseelle. “A interpretação reversa, como chamamos, permite que a voz da professora surda seja ouvida em toda sua potência”.

A relação entre professora e intérprete vai além da linguagem. É construída com base em diálogo, respeito e objetivos pedagógicos comuns. “Nos reunimos antes das aulas para alinhar conteúdos e estratégias. É um trabalho colaborativo, que me proporciona crescimento profissional e pessoal”, diz Dayseelle.

Do outro lado, os alunos também aprendem. Para Maria Renata de Oliveira, estudante do 3º período de Fonoaudiologia, essa convivência tem sido transformadora. “É muito importante. A gente, como profissional de saúde e como cidadão, precisa saber se comunicar. Ter uma professora surda amplia nossa visão sobre inclusão e nos prepara melhor para lidar com a diversidade na vida e no trabalho”.

Juliana reconhece a importância desse papel inspirador, mas prefere destacar o coletivo. “O Dia Nacional da Libras é um marco de resistência e reconhecimento. O que eu faço é ensinar — com minhas mãos, com meu corpo, com minha história — e mostrar que é possível. A acessibilidade começa com a disposição de ouvir, aprender e respeitar o outro”.

Na Uncisal, essa disposição vem se consolidando, pouco a pouco, em ações concretas. E cada aula ministrada por Juliana é, por si só, uma aula de cidadania.

* Com Assessoria