O julgamento do assassinato da farmacêutica Marcelle Bulhões segue nesta segunda-feira e deve ser concluído ainda hoje. Durante a tarde, a defesa de Cícero Messias da Silva Júnior, representada pelo advogado José Roberto Andrade de Souza, adotou uma série de estratégias para tentar absolver o réu, acusado de matar Marcelle a pedradas no dia 8 de março de 2023. O júri que analisa o caso é formado apenas por homens: sete, no total.
Ainda pela manhã, a defesa questionou repetidamente as testemunhas sobre a religião de Marcelle, apontando que ela era praticante da Umbanda — o que, segundo o Ministério Público e a assistente de acusação, é uma tentativa de deslegitimar a vítima por meio de racismo religioso.
Além disso, o advogado de defesa tentou sustentar a tese de que o réu teria “perdido a cabeça” após ser supostamente agredido por Marcelle, alegando que “qualquer homem perde a cabeça quando é agredido por uma mulher”.
Em outro momento, o advogado José Roberto Andrade de Souza falou sobre a Lei Maria da Penha, afirmando que “não tem que empoderar mulher porque paciência tem limite” e sugerindo que Marcelle era quem perseguia o réu.
O advogado da defesa também criticou a criação e o fortalecimento da legislação de proteção às mulheres, alegando que nada disso teria surtido efeito, já que, segundo ele, “todos os dias temos mulheres mortas” e que “há inclusive uma pesquisa que mostra que a mulher agride mais o homem do que o homem a mulher”.
NOTA DA REDAÇÃO: A alegação de que “mulheres agridem mais homens do que o contrário” não é respaldada por dados oficiais. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023, 91,8% das vítimas de feminicídio no Brasil são mulheres assassinadas por companheiros ou ex-companheiros. Além disso, a cada hora, quatro mulheres são vítimas de violência doméstica no país. Portanto, não há nenhuma pesquisa reconhecida que comprove a afirmação feita pela defesa no julgamento.
Ainda durante sua fala, segundo o Ministério Público, o advogado afirmou: “Só quem levou um tapa na cara e deu o outro lado foi Jesus Cristo”.
Promotor contesta versão da defesa
Durante sua manifestação no plenário, o promotor de Justiça Tácito Yuri criticou duramente a tentativa da defesa de transformar o réu em vítima. “Muitas vezes, os advogados são as primeiras vítimas das mentiras dos seus clientes, e foi exatamente isso que aconteceu aqui. Parece até que a vítima foi o rapaz”, ironizou.
Rebatendo a tese de que o réu teria agido sem intenção, o promotor reforçou “quem recebeu uma sentença perpétua foi a vítima. Não se sustenta nada do que foi dito aqui pela defesa. Tratam o homem como um coitadinho. Dizem que não houve intenção? Isso é um castelo de cartas.”
O promotor também rebateu o apelo da defesa para que os jurados não o condenassem por feminicídio. “A defesa pediu que o conselho não cometesse a barbaridade de condená-lo pela qualificadora de feminicídio. Mas barbaridade quem cometeu foi ele. Não há lógica que sustente essa tese. Marcelle foi morta de forma covarde, e não existe um laudo sequer que comprove que ele foi agredido por ela. Mas temos, sim, o laudo que mostra o estrago que ele causou nela.”
Em tom firme, o promotor lembrou que Marcelle foi silenciada de forma brutal e que Cícero teve direito a defesa. “Quem não teve oportunidade de falar foi a vítima. Ele a calou para sempre. E agora, diante dos senhores, tem a chance de se explicar. A defesa tentou dramatizar, dizendo que, se condenado, ele terá uma pena perpétua. Aqui, não existe prisão perpétua.”