O anúncio do presidente norte-americano Donald Trump, no último dia 9 de julho, sobre a imposição de tarifas de 50% a todos os produtos brasileiros reacendeu o alerta vermelho na economia nacional e Alagoas está entre os estados mais vulneráveis. Com uma pauta exportadora ainda concentrada no açúcar bruto de cana, o estado pode enfrentar um impacto severo caso a medida entre em vigor em agosto.
“Estamos falando do principal produto da pauta externa alagoana”, explica a doutora em Economia Camila Hermida, vice-diretora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEAC) da UFAL.
Segundo a pesquisadora, 98% do valor exportado por Alagoas aos Estados Unidos no primeiro semestre de 2025 corresponde ao açúcar VHP (Very High Polarization), utilizado principalmente na indústria alimentícia.
Uma relação histórica com a cana
“Essa dependência tem raízes profundas. A relação entre Alagoas e a cana-de-açúcar é centenária. A produção canavieira moldou a economia estadual desde o século XIX, sustentando seu parque industrial, a geração de empregos e a arrecadação pública”, observa a pesquisadora.
Em 2021, segundo dados do IBGE, a cana ainda representava mais de 50% da produção agrícola do estado, embora respondesse por apenas cerca de 2% do PIB estadual — revelando a fragilidade da estrutura produtiva.
Cidades canavieiras concentram maior risco econômico
O impacto das tarifas tende a ser mais forte nos municípios produtores de cana-de-açúcar, como Coruripe, São Luís do Quitunde, Maceió, São José da Laje, Atalaia e São Miguel dos Campos. Juntos, eles responderam por aproximadamente 78% das exportações de açúcar de Alagoas para os EUA entre 2015 e 2025. “Não estamos falando apenas de empresas. Estamos falando de empregos, de famílias diretamente impactadas”, alertou Hermida.
Além disso, o calendário da produção aumenta a preocupação. A safra costuma ter seu pico no último trimestre do ano. Caso as tarifas entrem em vigor, o impacto será sentido exatamente no período de maior volume de exportação.
Indústria química em alerta
Mas não são apenas as exportações que preocupam. O estado também depende dos Estados Unidos para importar insumos estratégicos destinados ao polo industrial químico e petroquímico localizado em Maceió e Marechal Deodoro. “Os EUA foram o segundo maior país de origem das importações de Alagoas entre 2015 e 2025, com uma pauta diversificada, em contraste com o padrão exportador”, destaca Camila Hermida.
Ela explica que insumos como 1,2-dicloroetano (usado na produção de PVC), soda cáustica, óleos de petróleo, etileno e polímeros compõem mais de 60% do valor total importado.
“Muitos desses produtos abastecem a indústria localizada em Maceió e Marechal Deodoro, com destaque para o polo cloroquímico e petroquímico do estado. Uma eventual elevação dos preços desses insumos, seja por tarifa de retaliação ou perda de fornecedores, pode comprometer a competitividade da indústria local e encarecer custos para esses setores da economia alagoana”, alerta a economista.
Resposta do governo precisa ser estratégica
Camila Hermida acredita que o governo brasileiro precisa ter uma postura firme, mas estratégica. “A diplomacia, na essência do que ela significa (construção de consenso, negociação multilateral e cooperação) precisa ser o norte da atuação do Itamaraty”, sugere.
Para ela, uma retaliação imediata poderia ampliar ainda mais os danos, sobretudo para estados cuja economia é vulnerável.
Oportunidade para mudar o rumo da economia alagoana
Apesar das dificuldades, a economista da UFAL vê o episódio como uma oportunidade de mudança. “A vulnerabilidade atual de Alagoas frente a medidas unilaterais como essa decorre da concentração excessiva de sua pauta exportadora e de sua inserção internacional limitada”, analisa.
Nesse sentido, Hermida defende ações urgentes para fortalecer setores emergentes, como derivados do coco, cerâmica, móveis, fécula de mandioca e artigos de látex. “É hora de acelerar a diversificação econômica de Alagoas, atrair indústrias inovadoras, valorizar setores emergentes e apoiar arranjos produtivos locais.”
“O anúncio de Trump pode, sim, trazer dificuldades no curto prazo, mas também pode servir de catalisador para um novo ciclo de desenvolvimento em Alagoas, mais robusto, mais diversificado e menos suscetível às intempéries do comércio internacional”, conclui.